sábado, 16 de dezembro de 2017

Doenças da Canola


Canela-preta

Esta doença, denominada blackleg ou phoma stem canker em inglês, é causada por duas espécies de LeptosphaeriaLeptosphaeria maculans (Fuckel) Ces. & De Not. [anamorfo Phoma lingam (Tode) Desm], em sua forma virulenta, e Leptosphaeria biglobosa Shoemaker & H. Brun (anamorfo Phoma wasabiae Yokogi), em sua forma menos agressiva. Constitui uma das doenças mais importantes da canola no mundo, ocorrendo na América (Canadá, EUA, México, Brasil, Argentina e Paraguai), na Europa, na Austrália e em alguns países da África. Na Austrália, chegou a inviabilizar o cultivo de canola. Atualmente, a redução média de produtividade é de 10%, embora possa alcançar de 30% a 50%. Os primeiros registros no Brasil datam de 1993, no Paraná. A severidade da doença foi elevada em lavouras dos híbridos Hyola 401 e Hyola 420 na região noroeste do RS na safra 2000, e danos foram maiores em lavouras com plantas debilitadas por geadas, ocorridas logo após a emergência das plantas, ou com injúrias relacionadas a resíduos de herbicidas.
A doença ocorre em várias situações climáticas, em diferentes variedades e com diversas práticas culturais. O nível de danos está relacionado à estrutura da população do patógeno. Isolados mais agressivos (de L. maculans, antigamente referenciados como “grupo A” ou PG [Patogenicity Group]2, PG3 e PG4 ) causam danos superiores a 50%. Isolados menos agressivos (de L. biglobosa, também conhecidos como “grupo B” ou PG1) infectam plantas no final do ciclo, causando danos inferiores a 2%. No Brasil, foram identificados isolados das duas espécies (PG3 e PG1).
O patógeno pode infectar todos os órgãos aéreos da canola. Nas fases iniciais de desenvolvimento, o tombamento causa falhas de germinação ou morte de plântulas. Os sintomas em cotilédones e folhas consistem em lesões circulares a irregulares, de coloração branco-sujo a amarelo-claro (Figura 1), que progridem para infecção sistêmica dos tecidos. Isolados de L. maculans causam cancros na base da haste (cancros da coroa, Figura 2), enquanto que isolados de L. biglobosa causam lesões marrom-claras com margem escura na porção superior da haste (chamadas lesões de phoma ou de caule). Cancros da coroa causam maiores danos, pois impedem a nutrição adequada da planta, reduzem o ciclo da cultura e ocasionam a maturação e rompimento prematuro das síliquas, com perda de grãos, podendo causar, também, apodrecimento de raízes.
O patógeno é disseminado pela semente, sendo essa via importante na infestação de novas áreas. No Canadá, até 2% de sementes de canola apresentaram colônias de L. maculans. Durante a fase assexual, picnídios (pequenas estruturas negras puntiformes) são formados sobre as lesões, liberando massas rosadas de esporos. A fase sexual ocorre tanto em cancros quanto em restos culturais (Figura 3), com a produção de peritécios e liberação de ascosporos, capazes de viajar pelo ar a longas distâncias. No outono ou inverno, respingos de chuva disparam a liberação de esporos dos restos culturais. Lesões visíveis em cotilédones e folhas jovens desenvolvem-se após duas semanas do início da infecção. Destas lesões, o patógeno migra pelo sistema vascular até a coroa, onde causa cancro, ou causando lesões no caule (Figura 4).
Desenvolvimento tanto de lesões no caule quanto de cancros na coroa é mais rápido em regiões com alta temperatura no período do florescimento até a colheita, o que ocorre na Austrália e no Canadá. Esporos produzidos em picnídios são responsáveis por infecções secundárias a curta distância, sendo disseminados por respingos de chuva.
Como medidas de controle, indica-se: resistência genética, manejo de restos culturais, rotação de culturas e uso de sementes sadias.
  • Cultivares resistentes: na Austrália, cultivares ou híbridos com reação moderadamente suscetível (MS) são considerados adequados para uso em regiões de baixa precipitação pluvial, e aqueles com, pelo menos, reação moderadamente resistente (MR) são indicados para áreas de média a alta precipitação pluvial. No Brasil, foram introduzidos híbridos de canola resistentes desenvolvidos na Austrália (ver o item “Sementes” desta publicação). Nove genes maiores controlando a resistência à L. maculans (Rlm1 – Rlm9) estão caracterizados. Em várias situações, o patógeno quebrou a resistência após três a quatro anos de uso de novos híbridos resistentes. Por isso, as demais medidas de controle cultural, descritas a seguir, devem ser usadas em conjunto.
  • Pelo menos um ano de rotação de culturas é necessário em áreas onde houve ocorrência de canela preta, ou até a decomposição de restos culturais infectados.
  • Implantação de lavoura de canola distante de área afetada pela doença no ano anterior. Na Austrália, a pressão da doença cai marcadamente a partir de 200 m de distância e continua a declinar até 500 m, e parece não haver vantagem em aumentar o isolamento a partir desta distância.
  • Para não introduzir o patógeno em áreas isentas, ou para evitar sua reintrodução após rotação ou uso de híbridos resistentes, indica-se o uso de sementes: a) de genótipos resistentes; b) produzidas em áreas adversas para ocorrência de canela preta; e c) submetidas à análise de sanidade.
A aplicação de fungicida na parte aérea da canola, no estádio de 2 a 4 folhas, é prática frequente na Europa, mas só é viável em lavouras com potencial para altos rendimentos. Vários produtos são indicados no Canadá, na Austrália e na França. No Brasil, não há registro de fungicidas para controle da doença.
Foto: Gilberto Omar Tomm
Figura 1. Sintoma de infecção foliar de Phoma lingam (forma anamórfica de Leptosphaeria maculans), mostrando pequenos pontos negros em seu interior (picnídios).
Foto: Gilberto Omar Tomm
Figura 2. Sintoma típico de canela preta na base de caule de planta de canola, geralmente mais visível a partir da floração.
Foto: Paulo Kurtz / Leila Costamilan
Figura 3. Peritécios de Leptosphaeria maculans (estruturas pretas) em restos culturais de canola.

Figura 4. Ciclo de vida de Leptosphaeria maculans, agente causal de canela preta em plantas de canola.

Mofo branco

Doença causada pelo fungo Sclerotinia sclerotiorum (Lib.) de Bary, o qual infecta mais de quatrocentas espécies de plantas daninhas e de culturas dicotiledôneas, entre as quais soja, girassol e feijão, além de canola. É relatada causando danos nos EUA, no oeste do Canadá (redução média de produtividade entre 10% e 15%) e na Austrália, onde danos acima de 20% foram registrados. No Brasil, foi considerada a principal doença fúngica da canola entre 1997 e 2002. Tem potencial de causar danos em lavouras da região Sul e em áreas de temperatura amena do Cerrado, onde a canola integra sistemas de produção com a cultura de soja, o que poderia ameaçar a estabilidade do sistema de exploração agrícola desta última. Além de provocar redução quantitativa na produção de sementes ou grãos, a doença influi negativamente na produção e na qualidade de óleo de canola.
A colonização ocorre entre a fase de elongação e a fase de maturação fisiológica, mas os sintomas não são visíveis até o desenvolvimento das síliquas. A doença causa murcha de plantas afetadas, com queda foliar e podridão seca dos tecidos colonizados. Caules e ramos laterais colonizados apresentam cor palha ou marrom, sem perda de consistência (Figura 5). Em condições de alta umidade, micélio branco denso desenvolve-se nestas lesões, com presença ou não de estruturas escuras, de resistência, chamadas escleródios. Em infecções severas, as síliquas também são atingidas. Na maturação fisiológica, os tecidos colonizados apresentam aspecto seco, de coloração cinza, e ausência de micélio. Plantas doentes mostram aceleração na maturação, aspecto seco ou amarelado e as síliquas contêm sementes chochas.
O patógeno é introduzido em áreas novas por sementes contaminadas (tanto internamente quanto com a presença de escleródios no lote de sementes) e permanece na área formando novos escleródios na cavidade de caules e hastes. Estes tecidos tornam-se secos e quebradiços, o que facilita a liberação do patógeno. Os escleródios permanecem viáveis no solo por vários anos, e podem infectar plantas de canola de duas formas: germinando diretamente e formando micélio, ou desenvolvendo apotécios, dos quais são liberados ascosporos. Estes viajam em correntes aéreas, infectando plantas distantes em até 150 m, usando como substrato tecidos florais mortos ou em senescência (pétalas), depositados sobre folhas ou presos em intersecções de ramos laterais (Figura 6). A infecção é favorecida por longos períodos de temperatura amena (entre 10 ºC e 12 ºC por 10 a 14 dias).
Não há método de controle completamente efetivo. Devido à capacidade de sobrevivência em solo, sementes e em múltiplos hospedeiros, o controle é dificultado. O manejo da doença deve ser integrado, com uso de várias práticas, para evitar entrada de inóculo em áreas livres ou, após a instalação da doença, para diminuir o inóculo inicial. Indica-se:
  • rotação de culturas com espécies não suscetíveis, como gramíneas, por no mínimo quatro anos. Os benefícios desta prática podem ser reduzidos se houver mofo branco ou apotécios no solo em lavouras próximas;
  • usar semente sadia, produzida em campos sem doença, e sem a presença de escleródios no lote;
  • evitar sucessões canola/culturas suscetíveis (como soja ou feijão) em áreas onde a doença foi observada;
  • realizar semeadura direta em solo com cobertura uniforme de palha oriunda de cultura não hospedeira de mofo branco (ex.: gramíneas). Esta prática dificulta a dispersão de ascosporos e favorece a ação de micro-organismos antagônicos ao patógeno;
  • controlar plantas daninhas suscetíveis (“folhas largas”) e plantas voluntárias de canola ("guachas ou tigueras").
Não há cultivares ou híbridos de canola completamente resistentes a mofo branco. O Mofo Branco, é doença fúngica de solo, influenciada por rotação de cultivos e pelo sistema de produção estabelecido. Estudos recentes identificaram linhagens chinesas com resistência poligênica promissora à Sclerotinia na China (TIEDMANN, 2011) cuja eficiência em ambientes favoráveis à doença na Austrália foi comprovada (BARBETTI et al., 2012). Assim, nos próximos anos a alternativa mais eficaz para o controle de Sclerotinia, continuará sendo o emprego de fungicidas (TIEDMANN, 2011). Segundo Falak et al. (2011), no Canadá, a aplicação foliar de fungicidas apresenta sucesso variável apesar de critérios de previsão da ocorrência de Sclerotinia e do uso de fungicidas avançados. A Pioneer registrou em 2008, o híbrido 45S51, e em 2010, o 45S52. Testes em larga escala durante quatro anos compararam o controle genético com aquele de fungicidas e indicaram severidade da Sclerotinia menor que 50% a campo em 45S51 comparado com variedades não resistentes. O controle com 45S51 foi inferior ao dos fungicidas a campo, mas 45S52 foi notavelmente superior. O melhor controle à Sclerotinia foi obtido pela aplicação de fungicidas em híbridos com maior resistência genética (FALAK et al., 2011).
No Canadá, cultivares que produzem flores com pouca ou nenhuma pétala apresentaram menores índices de infecção que cultivares com flores normais. Entretanto, esta linha de pesquisa foi abandonada devido ao menor rendimento destes genótipos, comparativamente àqueles com pétalas normais (Com. pessoal Dr. Greg Buzza a Gilberto O. Tomm em 16/4/2003).
Na Austrália e no Canadá, indica-se uso de fungicidas de forma preventiva, quando as plantas estiverem entre 20% e 30% de florescimento, mas apenas em lavouras com perspectivas de altos rendimentos de grãos (entre 2.300 e 2.700 kg/ha, no caso do Canadá). Não há fungicidas registrados para uso em canola, no Brasil, e o controle químico de mofo branco com fungicidas está sendo avaliado.
Controle biológico, com aplicação de agentes microbianos, e transgenia também estão sendo investigados, mas os resultados ainda não são precisos.
Foto: Gilberto Omar Tomm
Figura 5. Caule de planta de canola com tecidos mortos pela infecção de Sclerotinia sclerotiorum, presença de escleródios (estruturas pretas no interior do caule morto) e micélio branco, típico do fungo.

Figura 6. Ciclo de vida de Sclerotinia sclerotiorum, causador de mofo branco em plantas de canola.

Podridão negra das crucíferas

É uma das mais destrutivas doenças das brassicáceas, causada pela bactéria Xanthomonas campestris pv. campestris. Tem distribuição mundial e pode ser encontrada na maioria das lavouras de canola, no Brasil.
Infecta folhas, caules, hastes e síliquas, em qualquer fase de desenvolvimento das plantas. Os sintomas caracterizam-se por manchas foliares circundadas por halo amarelo, evoluindo para lesões em formato de “V”, a partir da margem foliar (Figura 7). Tecidos vasculares infectados tomam coloração negra ou marrom-escura, e a planta murcha.
Condições climáticas favoráveis para a doença incluem temperatura alta (entre 28 ºC e 30 ºC) e períodos chuvosos na fase de desenvolvimento da cultura. A bactéria penetra pincipalmente por gotículas de água exsudadas por hidatódios localizados nas margens foliares, causando o sintoma típico nas bordas das folhas. Ferimentos e aberturas naturais são outros locais de infecção (Figura 8), que pode ser favorecida por geadas, pois a bactéria é nucleadora de gelo, e o rompimento dos tecidos, pelo efeito do congelamento, favorece a penetração de X. campestrispv. campestris.
Não há cultivares de canola com resistência à doença. Como medidas de controle, indica-se:
  • empregar somente sementes com sanidade comprovada, pois a principal fonte primária de inóculo é sementes infectadas;
  • fazer rotação com culturas não hospedeiras (das diversas espécies brassicaceas, como nabo-forrageiro) até decomposição dos restos culturais da safra anterior;
  • controlar plantas daninhas da família das brassicáceas (como a nabiça) e plantas voluntárias de canola durante o período de rotação de culturas;
  • Incorporar restos culturais após a colheita, se não for área sob sistema plantio direto.
Foto: Gilberto Omar Tomm
Figura 7. Sintoma de podridão negra das crucíferas em folha de canola (manchas foliares em formato de V, a partir da margem foliar).

Figura 8. Ciclo de vida de Xanthomonas campestris pv. campestris, agente causal da podridão negra das crucíferas em plantas de canola.

Mancha de alternária

Esta doença, também conhecida como black spotdark leaf spot ou Alternaria blight, em inglês, é causada por várias espécies do gênero AlternariaAlternaria brassicae (Berk.) Sacc., A. brassicicola (Schwein.) Wiltshire, A. raphani J.W. Groves & Skolko e A. alternata (Fr.) Keissl., cada uma delas com vários outros hospedeiros dentro da família das brassicáceas. Tem distribuição mundial e, quando severa, afeta tanto a produção de grãos quanto a qualidade do óleo, diminuindo seu conteúdo entre 15% e 36%. Os danos no rendimento variam entre 42% e 63%, no Canadá, e são da ordem de 40% na Índia, onde é uma das principais doenças da canola. No Brasil, a doença diminuiu a produção de sementes no Estado de São Paulo, causou danos no Rio Grande do Sul e esteve amplamente distribuída no Estado do Paraná entre 1997 e 2002.
A doença pode afetar plantas de canola em qualquer estádio de desenvolvimento. A transmissão ocorre por sementes infectadas, causando tombamento de plântulas ou pequenas manchas escuras em cotilédones e hipocótilos. Em estádios iniciais, a infecção pode rapidamente se instalar e resultar em níveis severos da doença e, finalmente, morte de plantas. Nas folhas, formam-se manchas arredondadas com halo amarelado, com aspecto de alvo devido à presença de estruturas escuras concêntricas dentro da mancha. Estas manchas podem medir entre 1 mm e 20 mm e, em grande quantidade, levam à murcha e à morte de folhas, podendo causar aborto de flores. Manchas escuras arredondadas e deprimidas são formadas em caules e em síliquas, acelerando a secagem e causando abertura das mesmas e queda de grãos antes da colheita. Nestes casos, é comum observar-se plântulas de canola recém-emergidas quando da colheita da safra.
Os esporos produzidos nestes tecidos são disseminados pelo vento e a doença alastra-se com o molhamento proveniente de clima úmido na primavera (Figura 9). O patógeno sobrevive em restos culturais e libera esporos no ar. Temperaturas amenas (entre 17 ºC a 24 ºC) e alta umidade são favoráveis para o desenvolvimento da doença, que progride mais rapidamente em lavouras com menores espaçamentos entre linhas e com doses de nitrogênio superiores a 80 kg/ha.
Como medidas de controle, indica-se:
  • usar sementes com boas qualidades fisiológica e sanitária, de procedência confiável, para evitar introdução do patógeno em áreas isentas ou reintrodução, após rotação de culturas. Armazenamento a 35 ºC, por certo período, ou imersão em água a 50 ºC, por 30 min, são alternativas que eliminam inóculo de sementes. Não há fungicidas registrados para uso em semente de canola ou para aplicação em lavouras, no Brasil;
  • fazer rotação com culturas não hospedeiras (eliminando as brassicáceas) até decomposição de restos culturais contaminados;
  • controlar plantas voluntárias de canola e plantas daninhas, no período de rotação de culturas.

Figura 9. Ciclo de vida de Alternaria spp., agente causal da mancha de alternaria em plantas de canola.


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